quinta-feira, 5 de janeiro de 2017



Pétalas

Do perfume que deixaste, 

meu amor,
fiz raíz, terra, haste,


céu que te devolve,
folhas onde te escrevo,
sol que nos envolve,
beijos em botão de prece,
protegendo a corola das memórias
dos frios que esquecem,
como se fossem sépalas.


De orvalhados gelos,
eu recolho as lágrimas que verto
no cálice onde macero pétalas
(as que guardo ainda
no abraço que aperto
com o laço de cetim
dos teus cabelos...)


e assim, meu amor, 
te sei essência
e te regresso 
ao limbo da existência.



maTer

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

poema para dizer que te tenho (dentro de mim)



       imagino-te em todos os lugares 
dentro do mundo
por aí
vivendo fora de mim
o mesmo segundo.

imagino-te
e é nessas viagens
dentro de mim
que reconstruo
as minhas imagens:
o perto e o certo
o assim e o sim
o aperto e o afecto.

imagino-te em todos os séculos
dos meus instantes
em todos os cantos
todos os quadrantes

e nunca te encontro
nunca estou contigo!
porque te procuro
porque te persigo?
-
se sei que o futuro
só me prometeu
um lugar no mundo
tão perto
tão perto
do lugar que é teu?
:
dentro do meu peito
num lugar estreito,
é lá que tu estás

é lá que no fundo
eu encontro a paz.


maTer

sábado, 3 de dezembro de 2016

Foi em Dezembro:


que dizer desse mês de contrastes
minha Vida
se ao oitavo dia - que bem me lembro! –
foi dia de Natal que prolongaste
por dois anos
neste mundo
...
e ao dia vigésimo segundo
ímpio arcano
o fez ser - de todos - o mês mais triste
Cruz tão fria
e me fez provar o fel que consentiste
em dar-me como bálsamo
na minha mais dilacerante sede
e agonia.


Era Dezembro.

Vede:
no lado esquerdo do meu peito
sob luz breve
tenho ainda a chaga que não nega
a cruz eterna onde me deito.

Foi em Dezembro
minha Vida:
o Natal antes do tempo...
e a despedida.

maTer
(a Diana *08.12.1985 - 22.12.1987*)

quarta-feira, 2 de março de 2016

As minhas mãos


As minhas mãos…
nunca soube bem o que fazer com elas.
Sacrifiquei-as, muitas vezes -
roí-lhes as unhas na aflição,
e, nos reveses,
retorci-as, como a roupa molhada
(de lágrimas),
usei-as como escudo,
escondi-as atrás do medo,
e, em segredo,
escrevi e rasguei com elas
tantas e tantas páginas!

O que melhor fiz com elas,
o que mais me redimiu,
por não saber, tantas vezes, o que fazer delas...
foi o carinho com que toquei as tuas,
a seda macia de que fiz as minhas luvas,
com medo de magoar a frágil flor da tua pele,
lírio de inigualável candura.

Mas - estava escrito no céu-
estas mãos em atonia,
seguraste-as como quem as sabe suas,
guiaste-as num desígnio de poema,
emprestando-lhes a arte que é só tua
- Poesia -
fingindo ser-lhes só inspiração,
ensinando-lhes que escrever também serena.

Ah, anjo bom,
esse gesto é perfume que perdura
e se evola, e me lava
estas mãos que me tomaste
teu doce duo de escravas,
porque as beijaste.

As minhas mãos,
pobres mãos de mim também,
desajeitada,
(que tantas vezes não soube que fazer delas),
são por Deus abençoadas
e eu, pensando bem,
só tenho que erguê-las e agradecer,
só tenho que pousá-las e escrever:

'Um Anjo passou por elas!'


maTer (2014)

quarta-feira, 18 de março de 2015

Sabes, meu amor...


Sabes, meu amor,
já sei por que partiste.
A vida é longa demais...
longa demais para se ser anjo,
larga demais para nos ser trilho
inquestionável...
Há tantas distracções, tantos caminhos,
tanta luz fátua a encobrir o brilho
imaculável
com que nascemos!
Tantos atalhos,
tantas encruzilhadas,
tantas flores efémeras
a iludir-nos nas bermas
das estradas!
Meu amor,
tanto martírio
a esperar-nos em cada esquina!
...
que, sendo tu frágil lírio,
flor-menina,
não resistirias à terra esmagada,
tão pisada,
por passos que se perdem nesta busca
(sempre vã, meu amor)
a que estamos condenados por sentença
crucial.
A vida é longa demais,
o céu é estreito,
por isso, meu amor,
te perco tantas vezes
no horizonte breve do meu peito...
mas nunca esta boca há-de negar-te,
nem a minha alma deixar de encontrar-te
tantas vezes
quantas a minha cruz cair ao chão...
Perdoa-me, anjo meu,
em lágrimas te peço,
cravejando a aridez das minhas mãos
...
não desistas de esperar-me
no fim do meu caminho,
com o teu riso de rosas frescas
e o teu olhar de de água doce,
como se ainda
tua adorada mãe
eu fosse... 

terça-feira, 17 de março de 2015

Houve

    Houve

    (beijos entre nós)

    sementes na minha pele
    raízes sulcando fundo
    imortalidade branca
    doce dor ternura tanta
    negando a fragilidade
    dos teus lábios.

    Houve abraços, houve braços
    as tuas mãos, os teus traços
    os teus olhos de menina
    e as palavras pequeninas
    que aprendemos

    sem saber

    que as que ficaram nos lábios
    por dizer
    e me seguram a ti
    meu amor
    são ainda botões tenros
    abrindo-se em cada beijo
    que me dás...

    em cada instante que sinto
    a tua paz.



quarta-feira, 29 de maio de 2013

LEGENDAS ÍNTIMAS





As mãos
como pássaros de asas descaídas
descansavam num céu de fundo negro

 
mas a boca era trilho entre roseiras
colhendo sorrisos entre espinhos
e beijos entre as curvas traiçoeiras

 mas os olhos eram lagos pequeninos
onde um anjo navegava a vida inteira
velando pelo bem de dois meninos...







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