quinta-feira, 29 de novembro de 2007

SÃO ROSAS, SENHOR...

Não, Senhor,

O que vês em mim não é raiva
Quando maldigo o cruel dia
Que me roubou minha flor...

São lágrimas, Senhor...

O que me adivinhas na alma
Não é ódio pela noite fria
Que me trespassou de dor...

São lágrimas, Senhor...

O vazio que me corrompe
E me limita à letargia,
Não é vida sem amor...

São lágrimas Senhor...

Não é desprezo pela vida
O desalento que adia
O renascer do meu fervor...

São lágrimas, Senhor...

Nem é espinho pungente
A saudade que me asfixia
E me deixa amargo sabor...

São lágrimas, Senhor...

Não é piedade de mim
A pequenez que me aniquila
Em miserável estertor...

São lágrimas, Senhor...

A negação da verdade,
O medo do novo dia,
Temer do Sol o fulgor...

São lágrimas, Senhor...

Não é terminal desalento,
Ou cobarde paralisia,
Nem arco-íris sem cor...

São lágrimas, Senhor...

O que ficou em mim não é mágoa,
Se escolheste para Teu jardim
A minha mais tenra flor...

São lágrimas, Senhor...

E se o meu botão-de-rosa
Essa predilecção merecia,
Perdoa-me a suprema dor...

São espinhos, Senhor...

Um tão humilde tributo
Para ter uma Estrela-guia,
Um doce Anjo protector...

São graças, Senhor...

Eu Te agradeço, Senhor,
Pelos filhos que a minha Vida
Guarda ainda em seu penhor...

São bênçãos, Senhor...

Mil graças Te dou, meu Deus, pelas duas flores que me restam,
Promessas de Primavera no meu precioso Jardim...
Sei que as carícias de um Anjo voam na brisa envolvente...
E o perfume que paira...

São rosas, Senhor...



(Escrito em Maio de 1988)








sábado, 24 de novembro de 2007

---DIANA---Minha cândida inspiração


Queria pintar-te a mil cores mas não me basta a tua lembrança para poder expressar com lealdade o teu brilho, o teu encanto, a tua cândida pureza...
Na minha paleta não encontro cores que fidelizem a tua aura.
Os toscos pincéis que uso nunca seriam suficientemente precisos ou delicados para eternizar numa crua tela a ternura do teu sorriso, o brilho inocente dos teus olhos, a seda pura dos teus cabelos...
Não, não saberei nunca reflectir a imagem que de ti guardo no peito, no espelho das minhas lágrimas sobre o papel estéril...
...Resta-me este modesto ensaio, a preto e branco... como os retratos antigos. Digo isto e a minha alma rebela-se! Tu és cor, ainda, em mim! E nunca será antiga, a tua imagem em mim! Perdoa-me, filha, sou só incapaz de reproduzir fielmente a tua beleza pura com tintas traiçoeiras, que temo borratar num tremor de pincel. Não tenho talento que me baste. Então fiquei-me pelo carvão, que posso apagar, fazer e refazer, em busca da perfeição impossível.. Mas, sabes, vejo tanta cor, para lá dos negros traços! Tanta luz, tanta energia! Serás sempre minha, estejas onde estiveres, porque ainda existe uma conexão infinita entre esses teus olhos risonhos e o meu triste olhar de mãe-orfã...

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

BALANÇA DE LÁGRIMAS

Foi um Domingo de Sol que te trouxe para mim,
Mas uma noite de Inverno colheu-te dos meu braços
E escolheu-te outro jardim

Vieste de mansinho, como presente inesperado,
Foste embora sem aviso, com um leve roçar de asas
De Anjo santificado


Foste afago de Primavera, brisa de Verão,
Promessa de rosa rara que o Outono não ousou abrir
E não passou de botão...

....

Chegaste num dia azul
Tocado de brilhos,
Partiste em dia cinzento
Sem norte e sem trilhos

Meu inefável amor,
A imensa dor que amargo
Não paga a suprema benção
De um Anjo ter criado

Pedaço de mim
Arrancado a frio,
Mas em dois breves anos
Mereci o Estio

Meu amor eterno,
A dor é pungente,
Mas não amortiza
Tão belo presente

Levaste-me a alma
Ao escolheres o Céu,
Mas mil eu daria
E quanto tenho de meu,

Para merecer ter sido a fonte,
O abrigo, o albergue,
O suporte e o sustento
Da tua vida tão breve...

Dois anos deTi... ...Uma vida de Saudade

domingo, 4 de novembro de 2007

Remissão

Porquê?
Porque não fui atenta e preveni o risco?
Porque fui tão insensata e desvalorizei o perigo?
Porque fui tão lenta a compreender o que tinha acontecido?
Porque não fui inteligente para lidar com a situação?
Porque não te sacudi e te magoei mesmo, para evitar o mal maior?
Porque não gritei e movi montanhas?
Porque não exigi saber e exigi que soubessem?
Porque tolerei a demora e a impassividade?
Porque acreditei que o perigo estava controlado?
Porque não te segurei nos últimos momentos?
Porque te confiei a mãos que nada puderam fazer por ti?
Porque não tentei eu dar-te a minha vida?
Dar-te um sopro, um alento, um pedaço de mim ou toda eu, por ti, meu doce amor?
Porque te larguei e te deixei ir para longe dos meus olhos?
Porque fraquejaram as minhas pernas ao ouvir a terrível verdade?
Porque não corri para ti, te apertei ao peito, te transmiti a minha vida?
Porque não te supliquei que não me deixasses?
Porque não te disse que, se partisses, a minha alma se partiria de saudade?
Porque não te fiz sentir o meu imenso amor?
...para que, pelo menos, levasses impressa em ti essa certeza absoluta...
Porque não te embalei uma última vez e te ninei, até adormeceres para sempre?
Porque não te quis ver, para não acreditar?
Porque acreditar que me tinhas deixado, era insuportável...
E uma força gelada me pregava ao chão, me impedia de reconhecer na tua carinha angelical o expectro frio da Morte...
...Porque a ideia de ver-te ali, fria e inerte, tu, sempre tão irrequieta e viva, era inconcebível... era dilacerante demais...
...Ver-te, era assumir a verdade que eu não queria ver...
Eu juro que tentei, várias vezes, erguer-me da minha dor e ir até ti...
Mas não consegui...Perdoa-me, filha...
Perdoa-me por não te pegar ao colo pela última vez, não cobrir o teu rostinho amado de beijos...
Eu não te rejeitei, filha, só estava a rejeitar a tua morte...
...
Porquê?
Porque não te segurei sempre, enquanto pude, até te arrancarem de mim?
Porque não soldei com lágrimas o teu corpinho ao meu?
Porque não enchi os meus olhos da tua imagem?
Porque não me embriaguei com o teu cheiro de flor recém-colhida?
Porque não senti o teu frágil corpinho abandonar-se nos meus braços?
Porque não senti o peso da tua alma pura, emanar de ti e elevar-se ao Céus?
Porque não senti as tuas asas roçarem-me de leve, ao partires para sempre, meu Anjo?
Porque não te penteei eu mesma, uma última vez, os teus cabelos de ouro fino?
Porque não te vesti eu própria, o teu vestido branco bordado, com o mesmo empenho e cuidado com que to vesti no dia do teu baptizado?
...Com o mesmo carinho e enlevo com que sonhei vestir-te de noiva...
Porque não fui eu a deitar-te na tua derradeira cama, tão cheia de brancos e cetins frios?
...e te ajeitei os laços dos teus graciosos totós e a trança delicada dos teus dedinhos...
Porque não te aqueci eu, e te dei todos os beijos reservados para uma Vida completa... todo aquele tesouro de beijos que eu tinha amealhado para ti, nos meus sonhos de Mãe...
Porque não deixei que levasses as nódoas do meu pranto no teu vestido?
Porque não depositei as minhas lágrimas no relicário das tuas preciosas feições?
...nos cantos da tua boquinha-botão-de-rosa, nas tuas longas pestanas de seda, no relevo perfeito do teu narizinho delicado...
Para que levasses para sempre em ti, qualquer coisa física da tua desesperada mãe...
Porque deixei que te levassem de mim, que te fechassem no teu sono eterno, minha bonequinha adormecida?
Porque deixei que a Morte te roubasse a Vida que eu te dei?
Porque não soube preservar-te de todos os perigos e manter-te aqui?
...Comigo...
Porque é que o meu amor tão grande de Mãe não bastou para te tornar invulnerável?
...Porquê??

Perdoa-me...


(Escrito em 1988)