terça-feira, 18 de novembro de 2008


AMPARO DOCE


Quando chegas, de mansinho,
nas minhas horas mais frias,
aqueces-me as mãos caídas
como feridos passarinhos...
Então...
sinto o teu encosto doce,
as tuas asas de lã,
feitas de nuvens branquinhas
e de brilhos de manhã...
Anjo...
quando chegas, mansamente,
trazes encostos de plumas,
onde a minh'alma doente
repousa as dores que adormeço...
Assim...
doce e quente o teu beijo
que só no meu coração sinto,
dissipa a verdade que minto
e tu és minha... outra vez!...
E não fraquejo,
embalo-te de novo o riso,
tomo de ti o amor,
que preciso partilhar
por todos os tempos, os ventos,
as pessoas e os alentos
que é urgente abraçar!...
A ti me recosto...
Sei que posso...

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

CRUZ DE QUEM PERDEU

Penso em ti...
Quando fio e desfio o meu rosário,
No trilho que sobe ao meu calvário,
Quando vendo e desvendo o que sofro
No templo do meu credo amorfo...

Penso em ti...

Quando ligo e desligo a minha luz,
Sempre que trevas sujam minha cruz,
Quando laço e deslaço as amarras
Disfarçadas de metálicas garras...

Penso em ti...

Quando ato e desato os fios frágeis
Que sustentam os meus gestos inábeis,
Quando fecho e desfecho a minha cena
E ensaio o ritual da minha pena...

Penso em ti...

Quando canto e decanto salmos tristes
Em coro com agonizantes cisnes,
Quando velo e desvelo a mortalha
Da melodia que no vento se espalha...

Penso em ti...

Quando faço e desfaço o meu leito
E cruzo em "mea culpa" o meu peito,
Quando nego e desnego os meus dogmas
E me escondo em vítreas redomas...

Penso em ti...

Quando creio e descreio da esperança
E me finco nas areias da vingança,
Quando construo e reconstruo as ameias
Arrastadas no fragor de marés cheias...

Penso em ti...

Quando traio e distraio o meu silêncio
Com gemidos que dos meus espinhos teço,
Quando escrevo e descrevo a minha sina
Nas entrelinhas do que a Bíblia me ensina...

...Penso em ti...

Sempre que a luz do Sol me anuncia
O rasgar de um novo dia novo
...Sempre que o luar me alivia
O cerrar da noite fria...

quarta-feira, 29 de outubro de 2008






O TEU BRILHO





Procuro-te no Céu
Quando está doce e rosado
Sabor fruto e rebuçado
E vejo-te sempre, amor...
Procuro-te no Céu
Quando está cristal e anil
Bordado a algodão doce,
Quando está pálido azul,
Velado por renda e nuvens,
Quando o dia ruboriza,
Quando a noite empalidece,
Quando o Sol me ilumina
Ou a Lua me ensina
Que as estrelas são messe
Que o meu toque não alcança...

Mas não perco a esperança,

Porque no veludo negro,
Feito do Adeus que nego
Te vejo o velar distante
Em cada brilho faiscante
Das pedrarias do Céu...
Só não sei qual é teu,
E então, por simpatia,
Como mão que acaricia,
Colho-as todas pra meu cofre
Venero-lhes a aura nobre,



Faço delas meu altar



Onde rezo o meu amar...

quinta-feira, 16 de outubro de 2008


ADEUS

Adeus...

Nos lábios
mordo o desejo
De te eternizar num beijo,
Nos olhos
apago as velas
Rasgadas por vis procelas,
Nos braços
prendo o momento
Onde expira o meu lamento...

A ti me prendo!

A Deus eu peço...

Que faça ruir o templo
Onde me ditam exemplos,
Que me cubra da sua dó,
Que não me limite ao pó,
Que me deixe beber do cálice
Deste último e intenso enlace!

A mim te prendo!

Adeus te nego...

E nem o vento, o mar, a morte,
Rasga o abraço eterno e norte,
Que faço guia, estrela e lembrança,
Mesmo que a Vida me leve a Esperança!!

Adeus...

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

O CÉU É DENTRO DO MEU PEITO...

Dizem-me que estás no Céu...
Mas que invisível véu
Te esconde dos meus olhos?

Procuro-te na claridade,
No silêncio, na oração,
E repetem-me a verdade:

"É no Céu que os Anjos moram..."
Mas os meus olhos que choram
Só tropeçam em abrolhos...

Não encontram o caminho,
Não sabem a direcção,
Perdem-se nos vãos do Destino...

Eu sei que subiste ao Céu,
Mas sem um terço meu,
Como te posso alcançar?

Mutilada e em ferida,
Sem forças para o caminho,
Como te encontro, querida?...

Faço-te um Céu na minh'alma
E não admito que vivalma
Me diga que o Céu é azul...

O Céu é dentro do meu peito
Onde faço teu bercinho...
É lá que o meu Anjo deito...





(Poema escrito em 23/12/1989, inspirado no "Minha Alma é o teu Céu", que eu tinha escrito meses antes e não conseguia encontrar, perdido nos meus cofres escondidos...)


MINHA ALMA É O TEU CÉU...



Em que Céu tu estás, amor?
Onde mora o teu Céu?
Não é no berço vazio
Onde esfriam teus lençóis!
Não é no meu colo quente
Onde caem minhas lágrimas!
Nem sequer no teu retrato
Onde ainda vive um sorriso...
Onde é o teu Céu, amor?
Onde estás, onde te encontro?

Ah!...

Meu amor, se estás no Céu,
Meu sonho, pedaço meu,
Esse lugar onde existes,
Longe de meus olhos tristes,
Só pode ser o meu peito,
E o teu diáfano leito
A minha alma em ninho,
Que abriga um passarinho
Cioso do seu calor,
Envolto em supremo amor...
Meu Anjo, as tuas asas
Leves e imaculadas,
Sinto-as no afago quente
Do bálsamo que mansamente
Pinta minh'alma de cor...
Porque o Céu lá mora, amor...



(Escrito em 04/11/1989)


terça-feira, 26 de agosto de 2008

Natal passado sem(pre)sente...

Vinha aí mais um Natal... As colinas de vinhedos despiam as folhas que o Outono tocara de brilhos de ouro velho e, a ritmo inverso, as ruas da pequena cidade vestiam-se de cor e luz. Melodias de sempre evocavam Natais Passados e pairava no ar, misturado com aromas doces, a essência tão própria da quadra, aquele não-se-quê de espiritual que nos enche de boa-vontade, de amor e de paz...

A jovem mulher entrou numa "loja dos trezentos" apinhada de gente que se forçava a dividir o magro orçamento dos presentes por todos os sorrisos das suas vidas, ou aqueles que, simplesmente, lá buscavam aquelas prendinhas impessoais e baratas para distribuir por amigos, colegas e conhecidos, com um "bom natal" desprendido e a soar a música de cor. Ela estava no grupo dos primeiros. Teria uns trinta anos, talvez menos, franzina e vestida de simplicidade. Deambulou pela loja, comparou preços, recontou discretamente o dinheiro que trazia apertado no velho porta-moedas, e, finalmente, decidiu: uma bola de futebol para o mais velhinho, que já andava na escola; um carrinho de corrida para o do meio, que, sabia, iria passar horas a empurrá-lo pela casa, sonhando pilotá-lo à velocidade do vento; e uma boneca e respectiva alcofa de plástico, vestidas de chita e rendas de poliéster, para a mais pequenina, a sua própria bonequinha, preciosa e delicada, que completava o "seu ranchinho" de filhos, que ela idolatrava. Saíu feliz, com um brilho no olhar que ofuscou as luzes da rua anoitecida...

Na manhã de Natal o brilho renasceu nos olhos dessa mãe, ao reflectir a alegria pura das três crianças. O Sol riu lá fora e o pai prometeu que, à tarde, iriam todos passear e ver a neve à serra.
Era um dia de Natal perfeito, e até os novos brinquedos os pequenos foram autorizados a levar para a aventura na neve.

Mas ao entrar na velha carrinha do pai, a menina chorou e reclamou a sua bébé: a alcofa estava vazia, a boneca acabada de ganhar, ainda só por tão poucas horas acarinhada pela sua "mamã", desaparecera. A mãe procurou debaixo dos bancos, debaixo do carro, no passeio, nas escadas, por toda a casa. Perguntou a quem passava, a quem passou, a quem parou, ninguém vira a boneca. A sua filha exigia a "bebé", com lágrimas pequeninas a cristalizar-lhe olhar, mas o pai reclamava a partida, o sol fugia, e ela nada mais pôde fazer senão sentá-la no colo, mimá-la e animá-la com a promessa dos bonecos de neve que iriam construir.

...Mas a alma daquela mulher mergulhou no poço negro de uma tristeza inexplicável. A carrinha de caixa aberta arfava, ao subir a serra para a desejada neve, e ela já não conseguia imaginar alegria. O Sol brincava no pára-brisas com reflexos traquinas, mas ela fechou-lhe os olhos e só viu sombras. Apoderou-se dela uma tão grande melancolia, que ela própria não conseguia traduzir em pensamentos...
Bolas, era só uma boneca, talvez no mês seguinte conseguisse poupar uns trocos e comprar outra... Olhou a filhita e nem a alegria pueril que lhe animava de novo a face rosadinha a fez emergir do torpor. O seu olhar caíu na alcofa vazia, instintivamente apertada nas mãozinhas delicadas da criança.

A tarde esgotou-se depressa em alegres brincadeiras, batalhas de neve e construção dum enorme boneco, com nariz de pinha e boca de rebuçados. Mas a tristeza persistiu no coração daquela mãe e agravou-se quando o filho do meio insistiu em querer levar o boneco para casa, e a mais pequena reclamou uma boneca de neve para por na caminha desocupada. O regresso acabou difícl para todos, e ela, sempre a trave mestra da família, parecia ser a mais vulnerável e desalentada, ao ponto de o marido se impacientar com o seu estado de espírito. Mas como explicar-lhe o inexplicável? Aquela melancolia que a perda da boneca a fez sentir, aquele subtil pânico que lhe tomou a alma que ela não conseguia decifrar?... --"Entâo??... Quando puderes compras-lhe outra! Que disparate!"
Ela mergulhou um murmúrio nos cabelos perfumados da filha, que novamente se aninhara no seu colo, para o regresso:
--"É, desde que não perca eu a minha bonequinha..."

Mas perdeu. Dias mais tarde um estúpido acidente doméstico roubou-lhe brutalmente essa filha estremecida. Numa noite fria-de-morte, velada por um manto de nevoeiro cúmplice, que lhe aprisionou a Dor no peito e lá lha perdeu para sempre. E a caminha quente da sua filhinha ficou eternamente vazia e ela já não mais pôde entrar numa loja dos trezentos e comprar outra boneca...

Sterea D'Esejus (Teresa Rodrigues)
(Inspirado numa história real, numa angústia real, que me faz pensar sempre até que ponto não nos é dado saber o ponto de retorno... Aquele peso no peito, sei, foi o cravar das garras da Morte, que naquele momento, ali, me escolheu para vítima maior... Porque a minha boneca não é vítima, não pode sê-lo... Como, se é um Anjo de luz, se é o brilho mais áureo, a flor mais fresca, no altar do meu Deus??...)

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

(NO CÉU...)

Se por ti sinto ainda tanto,
Flor que plantei,
Se por ti choro eterno pranto,
Amor, eu sei,
Que tu o sentes no chão que pisas
E que eu guardei
Na alma doce, entre as espigas
Da minha lei.
Porque o céu que habitas, anjo tão meu,
Eu digo e sei,
Está no meu peito, onde nasceu
Quando chorei
A tua ausência pra sempre eterna
Que sei,
Será encontro, presença terna...
Eu creio
Num dia, enfim, perto de mim,
No seio...
(No Céu...)

quarta-feira, 11 de junho de 2008

ANJO MEU

Anjo meu, saudade minha, flor em botão,

Que a Vida não ousou abrir, por tão sagrada,

Ar que me falta, supremo sopro, luz ansiada

Porque suspira um terço do meu coração...





Anjo alado, doce boneca de porcelana,

Que divino toque animou em requebros doces,

Foste água fresca, qu'evaporou em celeste chama,

Amor-menina, jovem, mulher, quem dera fosses!





Esses teus lábios de doces beijos de passarinhos,

Esses teus olhos, de luz de estrelas, a cintilar,

São puras jóias de que só guardo terna saudade,





Eterno brilho, qu'em mim lavra, mas que não arde,

Eterno Anjo, que Deus quis acarinhar,

Mas que deixou tão quente e doce minh'alma-ninho!!









quinta-feira, 17 de abril de 2008

RIMAS QUE CHORAM

Saiam do caminho, rimas,
Hoje não quero rimar,
Meu coração está em lágrimas
E vocês ousam brincar?

Parem de entoar cantigas
Como quem canta o amor,
Esta dor que me castiga
É espinho órfão de flor!

Tenham piedade, harmonias,
É negra a minha saudade,
Tão negra que os meus dias
Escurecem por caridade.

Porque afloram o meu choro?
Não vos peço, só desejo
Que esta prece que oro
Seja lamento num beijo!

Beijo que quero que seja
Doce, saudoso e alado
P'ra chegar a uma princesa
Dum reino no céu encantado.

No meu coração de mãe
Guardo seu berço e escrevo
Versos que rima não têm,
Só lençóis do meu enlevo...

Não insistam, doces rimas,
Sei da vossa intenção.
Poesia, sei que me estimas,
Mas não quero versos, não...

...Só quero a doce menina
Que chora o meu coração...



(escrito em 1990)

sábado, 12 de abril de 2008

BONECA DO MEU ALTAR


Guardei de ti a imagem de boneca
Que brincou no calor do meu regaço...
Fazia-te, nos cabelos, doce laço,
Em jeito das asas de borboleta...

Guardei-te no cofre da minha alma,
Já que a Vida te recusou um lugar...
Talvez p'ra teu brilho preservar...
Talvez p'ra que fosses o meu bálsamo...

Guardei o teu brilho num lugar
Onde só o meu coração o pode ver,
Boneca de vivo amor, que é só meu...

Guarda-me tu, doce Anjo, no altar
Da saudade que vive até eu morrer...
Boneca, brinca em luz, lá no teu Céu...

ENCONTRO-TE NO CRESCER DA MINHA SAUDADE...

Filha, doce amor,
Minha doçura,
Que os meus olhos não puderam ver crescer,
Cresces em mim, em cada dia, no louvor,
Que a Deus dou, por teus irmãos eu merecer!

Amor, doce amor,
Filha ternura,
Que minhas mãos buscam no vazio do teu berço,
Encontro-te em mim, cada vez que a minha dor
Se ameniza em duas partes do meu terço!

Querida, doce amor,
Frágil candura,
Que a minha alma guarda em moldura de cristal,
Vejo-te sempre, quando olho, embevecida,
Os protegidos da tua aura angelical...

segunda-feira, 17 de março de 2008

PEDRA DE TOQUE



Eles não sabem que o Tempo
se curva em servil devoção
ao voo breve dos Anjos...
Eles não sabem que os anos
se dividem em segundos,
não dias,
nem meses,
nem estações,
quando se recorda um Anjo...
Eles não sabem que as mães
têm um coração diferente,
inviolável ao Tempo,
descrente de esquecimento,
só sensível à saudade
e ao roçar de asas de Anjo...
Eles não sabem que os filhos
são a nossa melhor moldura,
a aura que nos perdura!
-mais ainda se sorrisos
e balbuciares embevecidos
embrulhados em lembranças,
são tudo o que restou
de tanto amor amealhado
para o bragal duma Vida
que não chegou a noivar...
Se limitou a voar,
levando como grinalda
a minha alma enfeitada
de flores brancas de saudade...


(22 de Dezembro de 2002)

sábado, 8 de março de 2008

FOSTE O MEU MELHOR POEMA

Foste o meu melhor poema, amor,
Inspiração que pairou
E sem avisar me tomou
Em versos que escrevi de cor.


Foste o meu melhor quadro, amor,
Aquele que pintei sem tela,
Sentimento em aguarela
Pintada com uma flor.

Foste pétala ao vento, amor,
Arrancada da doçura
Do meu amor enfeitado...

Foste o meu poema roubado,
Obra-prima sem moldura...
És o mel da minha dor...

segunda-feira, 3 de março de 2008


SONHO...


Sonho que mereço ainda o carinho
Das tuas mãos, inquietas borboletas,
Dos teus beijos construídos no meu ninho,
Das carícias, que da minha alma libertas.

Sonho que mereço ainda as tuas lágrimas
Que minhas mãos colhiam, pressurosas,
Em vasos de cristal que, por magia,
Eu transformava em volátil odor de rosas...

Sonho que mereço ainda o teu apelo,
Em acordes cor do céu, e tons de flores,
O canto mavioso que foi elo
Que soldou os ecos do nosso amor.

Sonho que és ainda a minha estrela
Que salvei numa noite sem luar.
Mas - ai de mim! - incapaz de prendê-la,
Vejo-a soltar-se, subir ao Céu, p'ra me velar!

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

CÁRCERE DE SAUDADE

Hoje a manhã está a chorar...
Por ti, meu amor...
E as lágrimas que o vento traz
Agarram-se à janela do meu olhar triste,
Escorrem em desesperado silêncio,
Tentam tocar os meus dedos,
Lamber-me as dores,
Por entre as grades gélidas da saudade...

O vento é cruel carcereiro,
Faz da chuva chicote,
Despedaça murmúrios das árvores,
Lá fora...
Contorce gemidos aprisionados
Em mim...

A chuva compadece-se...
E o seu toque na minha janela
Transforma-se em lento prantear
Que escorre meigo, balsâmico,
Na frieza vítrea da minha saudade...

Mas os dedos dolentes da chuva,
Insistentes, meigos, coleantes,
Não conseguem penetrar o inatingível vazio,
Que resguardo,
Para cá da vidraça fria,
Ao morno torpor desta fogueira
Onde queimo saudade...


(escrito em 18 de Fevereiro de 1988)


sábado, 16 de fevereiro de 2008

O AMOR ACONTECE...

O amor não se planeia...
Acontece.
E a nossa história de amor,
Poema,
Escreveu-se em pétalas errantes
Na brisa
Duma primavera perdida
Em mim...

Nosso amor foi conquistado
À força.
Lutou com pré-julgamentos
Sem nexo,
Debateu-se em noites frias,
Sem sono,
Lutei por ti contra tudo
E todos...

Mas eu levei-te a bom porto,
Meu barco,
Deixei fluir minha dor,
Dei tempo.
E trouxe-te ao sol da manhã,
Luz minha,
Amei-te ao calor do meu astro,
Fulcral...

Dei-me toda ao teu amor,
Princesa,
Do meu reino ao sol nascente,
Rainha,
Bebi do mel do teu cálice,
Flor rara,
Dei por vingada a dor,
Fui Céu...

Mas não pode o meu azul
Prender-te...
Não mereceu tua luz
Meu quadro.
Deixaste-me órfã de ti,
Partiste,
Amor a quem dei o nome
De filha...

O amor não se planeia,
Acontece...
Mas tem a Vida que ser tão
Injusta???


( Dezembro de 1988)

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

LUZES NAS TREVAS

Quando nasci, fui luz...
Sei que fui.
Pelas reminiscências de auroras musicadas por trinados azuis...
E pelas saudades que guardo dos entardeceres tingidos de róseas ternuras...
Vivi dessa luz em prolongadas primaveras, sem picos de Verão, nem gelos de Inverno -
só tépidos afectos temperados de amor...
Depois cresci...
Abruptamente, o vento trouxe o Outono, e cortinas de noite fecharam-me a luz. E o que restava dela, da luz própria que eu fui, esgotou-se na procura da sobrevivência, nos meandros do labirinto onde tropecei...
Mas nem o dia , nem a noite, têem permissão de permanência, e nada nesta vida é definitivo e absoluto...
E quando a minha luz ameaçava extinguir-se na corrente inexorável do ar frio, eis que me nasce uma Luz!
Tão vívida e clara, que ofuscou as tremeluzentes trevas em mim!
Tão quente, que adoçou o meu frio e me desvendou o escuro incógnito!
Alimentei-me dela, vivi por ela, e, num crescendo de Vida, ela repetiu-se em mim, mais uma vez, e ainda mais uma vez!
Fui três vezes Mãe, três vezes fui centelha da chama do Amor maior...
E três círios suspensos em candelabro de cristal fino, iluminaram-me a vida, abriram-me as sombras à luz de manhãs pintadas de orvalho...
Mas, numa esquina mais agreste do meu caminho, uma das minhas três Luzes partiu-se:
Caíu-me das mãos, humanas e imperfeitas, incapazes de suster a leve transparência das asas de um Anjo...
Perdi uma das minhas Luzes...
Perdi-me dentro da minha dor...
E a escuridão da minha saudade reflectiu-se, inteira, na opacidade do meu olhar...
Salvou-me, então, o clarão fulgente das duas Luzes que me ficaram...
Apagaram-me as sombras, devolveram-me a claridade, decompuseram-se, só para mim, em arco-íris de mil cores, através do cristal das minhas lágrimas...
E a minha alma sobreviveu milagrosamente, mesmo mutilada, mesmo decepada, assim, sem um terço de si...
Sobreviveu, e viveu, e deu de si a luz que era a luz reflectida das suas Luzes vitais...
E, aos poucos e poucos, o terço negro do seu todo revelou-se em Luar...
Luar de áurea brancura, diáfano, celeste, divino...
Luar de Anjo de Luz, que não ofusca, envolve, protege, aquece e revela a eternidade de um Amor...
...O Amor de Mãe...

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Passou mais um Natal...

Minha linda...
Há tantos dias que não deposito nem uma pequena pedrinha semi-preciosa no cofrezinho que fiz teu bragal...
Sabes que, do início do Inverno até passar o Natal, sinto sempre a tua presença mais forte. Aí pelo dia 1 de Novembro, quando semeio a tua campa rasa de rosas brancas, até não se ver nem um pedacinho de terra inerte, começa a minha descida... Daí até ao Natal, vai-me tomando, aos poucos, uma melancolia subtil, um laço de saudade que vai apertando, apertando... Os cânticos embalam-me uma dor que ganhou raízes e as luzes tremeluzentes não conseguem iluminar o meu Inverno...Voltam-me à memória tantos outros Natais, em que parte de mim morria contigo, e outra, solicitada pela minha responsabilidade familiar, ensaiava sorrir, brincar... vibrar, enfim, com os cânticos, as luzes, as prendas... Mas sei que tenho de pedir perdão aos meus filhinhos amados pelo Natais em que eu não estive completamente com eles. Perdão, meus filhos, perdão por tantas coisas que só vocês compreendem e pelas que só eu posso compreender... Amo-vos tanto, nunca vocês saberão quanto vos devo a minha vida e o meu equilíbrio! Vocês dois são o tributo mais precioso que lego ao Mundo, nesta minha curta e insignificante passagem pela Vida! E tu, Dianinha, és o tributo que eu leguei aos Céus...
Talvez me deva sentir ditosa por isso, quem sabe...
Mas, neste vigésimo aniversário da tua morte, sinto-me ainda tão dorida e revoltada...
Fecho os olhos e imagino-te, nos teus graciosos vinte e dois anos... Através da vidraça viva das minhas lágrimas, metamorfoseio o teu rostinho delicado de bebé num rosto belo, de jovem mulher... Imagino o teu corpinho franzino e sempre de uma elasticidade irrequieta, tranformar-se em formas perfeitas, de nobre porte... vejo os teus cabelos de seda soltarem-se dos totós onde eu os aprisionava, e voarem em volta dos teus olhos meigos e grandes, como beija-flores, em adoração serena... Sonho os beijos leves, carregados de amor, que a tua boca talhada em botão-de-rosa me daria ainda...
Oh, minha filha, sonho tanto! Mas se não fossem os meus sonhos, como seria a minha vida??
...E deixo os sonhos viver, lado a lado com as minhas dores... e, sabes um segredo? - Nas minhas (tantas!) horas amargas, nunca deixei de sentir a tua ternura, gravada para sempre na minha alma, naquele dia em que eu chorava, derrubada pela minha Vida madrasta, no chão da cozinha, daquela casa onde morávamos... lembras-te, filha? Tu, pequenininha, nem ainda com dois anos, foste-me buscar uma almofada e vieste consolar-me com um "Pom... pom, mãe..."... Ah, como dói essa lembrança!... Como posso deixar de chorar-te?!

terça-feira, 8 de janeiro de 2008


EXPIAÇÃO



Posso viver a sofrer,
Sofrer é a minha estrada...
Mas sofrer a tua perda
É pranto que se não trava!

Se cumpro pesada pena
Pelo que fiz ou farei,
Não é justo que ainda sofra
Esta dor que não chamei...

Porque me abandonaste,
Suprema e alta clemência?
Porque me deixas curvada
Por uma sana demência?

Não há justiça na Terra,
Ou antes, quem a mereça,
E eu, pobre pecadora,
Só posso pedir que anoiteça...

Que venha a noite encobrir
Os sulcos das minhas lágrimas,
Que venha a Morte abafar
O virar das minhas páginas...

(1988)

PRESENÇA

Vejo-te quando abro os olhos
E não reconheço a manhã,
Porque o brilho do Sol
Esmaece, envergonhado,
Como a pedir-me perdão
Por me lembrar o teu brilho...
Vejo-te quando adormeço
E não encontro o silêncio,
Porque o sussurro das lágrimas,
A esconder-se do escuro,
Como tímidas borboletas,
Acordam a minha saudade...
Vejo-te quando te lembro
E dói-me tanto o desejo!,
Duma rosa de Dezembro,
Dum Anjo que a Deus invejo...




quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

TRILOGIA (ou AMOR NUM SÓ TEMPO EM TRÊS MOMENTOS)

27/Março/1981

Quando tu chegaste,
Meu mar de esperança,
Todo o verde se acendeu
Na avidez do teu olhar,
Como se a Primavera
Nascesse contigo,
Naquela jovem noite de Março

Encheu-me a alma
A tua presença,
A urgência do teu chorar,
A luz do teu sorrir,
O extâse sensorial do teu toque,
Da tua posse...

Um filho...
Meu filho primeiro,
Amor por inteiro,
Centro do meu mundo
a entrar em solstício de Verão...



20/Novembro/1984

Quando tu vieste,
Meu cálice de mel,
Fundiste as cores de Outono
No ouro do teu olhar,
Como se a Vida
Brincasse de Midas,
Naquela tarde meiga de Novembro

Revesti minha alma
Do brilho novo
Dum caro tesouro,
Terno querubim,
Meu pomo frágil, suprema dádiva
Ao meu poder de amar...

Meu filho...
Um filho é sempre único,
Amor prelúdio
Dum cerco de luz
a esboçar-se na lareira quente do meu colo...



08/Dezembro/1985

Quando tu chegaste,
Rosa inesperada,
O Inverno riu
E a estrela da manhã
Chamou o Sol para ver
Tão belo presente,
Envolto em carícias de Dezembro

Enfeitei minha alma,
Vesti-me de amor,
Gravitei novo vértice
De sedução e absoluto querer,
Banhei-me de luz,
Julguei-me completa...

Minha filha...
Pedaço de mim,
Pedaço de nós,
Suma perfeição que Deus quis tocar...
para acreditar...